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sexta-feira, 19 de agosto de 2011

NOSSOS FALARES: APROVEITANDO A DIVERSIDADE LINGUÍSTICA NA PRODUÇÃO DE TEXTOS ORAIS E ESCRITOS, EM SALA DE AULA.


RUBIA CRISTINA DOS SANTOS

ITAJAÍ (SC)
MAIO/2011

Artigo científico apresentado ao curso de Pós graduação da AUPEX como requisito parcial para obtenção de título de especialista em Contação de Histórias.
Professora Orientadora: Msc. Marinez Panceri Colzani


RESUMO

Este artigo, construído através de pesquisa bibliográfica, apresenta alguns porquês de se haver tanta diversidade linguística, para que sejam explanados aos alunos: uma tentativa para que passem a respeitar essas diferenças que estão ligadas à condição social, gênero, à época e ao lugar onde a pessoa mora ou viveu. Este trabalho traz alguns métodos de trabalho em sala de aula, para que haja um enriquecimento no momento de se contar uma história, através do uso dos diversos linguajares. Também na produção textual escrita ou oral, através, por exemplo, de radionovelas ou teatro.

1 INTRODUÇÃO


O gosto de observar os diversos linguajares brasileiros das pessoas que tenho ouvido fez com que eu pegasse esses elementos, que fazem parte da identidade de cada ser, e usasse-os em sala de aula. Falas de seres que estão inseridos em seu local e tempo, com suas relações familiares, profissionais e de amizades: diferenças que devem ser compreendidas como algo cultural.
E como sempre há alunos vindos de outras regiões brasileiras e catarinenses, muitas vezes, percebi um certo preconceito dos demais colegas. Entretanto, é preciso que eles conheçam as diversidades linguísticas, não só por causa do regionalismo, mas também pelas condições sociais e históricas. Então, como fazer com que eles percebam essas diversidades?
O artigo explica alguns dos motivos de termos falares diferentes, ainda que usemos a mesma língua; expõe que, mesmo o Brasil sendo um país tão rico em seus linguajares vindos das diversas culturas, nosso país conta com muitos preconceitos ligados a estas questões linguísticas. Este trabalho apresenta alguns exemplos do uso desses falares nos diversos meios de comunicação, como novelas e músicas, inclusive, de algumas músicas itajaienses. Também cita algumas maneiras de eles virem a ser trabalhados em sala de aula, como através de teatro, análise de vídeos, músicas, produções de radionovelas e da própria produção textual.
O trabalho está embasado em obras de Marcos Bagno, revistas Língua Portuguesa e Língua, Parâmetros Curriculares e analisa algumas novelas, músicas, vídeos e áudios com moradores de diversas regiões do Brasil, e de diversas classes sociais.


2 POR QUE, APESAR DE UTILIZARMOS A MESMA LÍNGUA, FALAMOS DIFERENTE?


Aqui no Brasil, a maioria das pessoas fala o idioma português, entretanto não falamos igual. A língua, com suas normas e códigos, é coletiva, mas a fala é individual e cada um tem seu jeito de falar. E esta maneira varia de acordo com vários aspectos.
De acordo com o Programa Gestão da Aprendizagem Escolar, de Língua Portuguesa, o Gestar (2008), a língua apresenta variações, conforme os grupos que a usem. Cada uma dessas variantes é chamada de dialeto, dos quais, os principais são: o etário (da criança, do jovem e do adulto); o geográfico, ou regional; o de gênero (feminino e masculino); o social (popular e culto); e o profissional.
O etário está ligado à época em que a pessoa viveu ou vive, o que aprendeu. É só comparar a fala de uma criança à de um idoso. O idoso pode também usar até gírias, entretanto, muitas delas são da época em que viveu, de sua juventude, sua profissão. Um jovem falará de acordo com o grupo em que está inserido. Exemplo, surfista, skatista, se navega na internet etc.
Dino Preti, em Gírias saem da informalidade, faz na Língua Portuguesa a seguinte citação:
A língua é só uma entre outras formas de comportamento, um entre outros modos de realização das atividades culturais praticadas pelo grupo. Como essas formas de comportamento, a língua varia no interior de uma sociedade de tal maneira que os indivíduos que têm entre si laços mais estreitos de convívio, relações de maior e mais durável intimidade, apresentam modos de falar muito semelhantes (ou quase idênticos), que os distinguem de outros indivíduos. (2009, p.42)

Preti ressalta que não há uma gíria da periferia ou da cidade, mas grupos sociais que criam determinadas gírias que “a princípio restritas, depois se espalham pelo convívio social com outros grupos e se generalizam”. Então, devemos sempre ligar a gíria a um grupo, quando formos pesquisá-la.
Em relação ao linguajar regional, o Gestar traz como exemplo as palavras nordestinas que, muitas vezes, são desconhecidas para o brasileiro mais do sul. E também fala sobre os sotaques:

Dado importante na consideração dos dialetos regionais é o sotaque, compreendido não só como a melodia típica da fala de cada região, mas o timbre aberto ou fechado com que pronunciamos as vogais e a pronúncia de determinadas consoantes. Aqui não é a divisão administrativa das regiões ou estados que vale: o norte de Minas Gerais, por exemplo, tem um vocabulário e mesmo o sotaque próximo dos da Bahia. (2008, p.23)

Ainda sobre a questão regionalista, Mário Eduardo Viaro, em O estigma do caipirês, publicado na revista Língua Portuguesa, comenta que muitas pronúncias que pensaríamos ser típicas dos caipiras e matutos ainda eram usadas em Portugal, no começo do séc. XX:
“arve”fruita”, “úrtimo”, “marfeito”, “prantar”, “invaporar”, “num quero”, “coiso”, “gumitar”, “home” (e o diminutivo “hominho”), “memo”, “mermo”, “muléstia”, “mericano”, “ruim”, “muntar”, “cama”, “inselência”, “Cremente”, “grandissíssimo”, “magina”, “onte”, “tamém”, “adequerido”, “beim nharto” (bem alto), “qué”, (quer), “quarquer”, “cheguemos”, “inté”, “voxmecê”, “barboleta”, “bença” (bênção), “crendeuspader”, “munto” (muito), “pagou a pena” (valeu a pena), “agardecimento”, “parteleira”, “pinguela”, “batucar”, “eu lê dei”, “macetar” (esmagar), “pipino”, “piqueno”, “piqueninho”, “púbrico”, “praino” (plano), “queto” (quieto), “dia de São Nunca”, “sastifeito”, “abobra”, “marelo”, “drumir”. (vol.44, p. 33, 2008)

Viaro comenta que essas semelhanças entre as formas portuguesas e caipiras são estudadas em algumas instituições, como o Projeto Caipira (USP) e o Iboruna/Alip (Unesp de São José do Rio Preto).
A variante ligada à questão de gênero aponta que a mulher tem um vocabulário mais afetivo e emocional, pois a história sempre exigiu isto dela. Entretanto, cada vez mais é desejada a igualdade entre homens e mulheres.
O social está ligado à norma culta ou popular. Ela não apenas aponta se a pessoa teve acesso, ou não, a uma boa educação, mas se tem o hábito da leitura, ou demais bens culturais. O dialeto social ressalta a desigualdade social.
Já o dialeto profissional mostra um vocabulário ligado a um meio profissional. Basta imaginar uma conversa entre médicos em qualquer reunião que seja. Muitas de suas palavras acabariam não sendo compreendidas por um cidadão comum.
Então, cada ser tem sua fala, ou idioleto, formado pelo conjunto de seu todo: sua idade, gênero, lugares onde viveu, onde nasceu, grupos formados por pessoas das quais se relacionou e identificou-se, profissões, grau de instrução, quais informações teve acesso etc.
Em Como nascem os sotaques?, artigo de Aldo Bizzocchi, publicado na revista Língua Portuguesa, o autor cita que as teorias científicas mais recentes dizem que a aptidão à linguagem é inata:
A criança nasce com seu repertório linguístico “zerado” em termos de vocabulário, sintaxe e pronúncia, mas traz do berço, módulos cerebrais que lhe permitem preencher esses vazios. Portanto, todos nós temos uma “língua do pensamento” que já vem pré-instalada “de fábrica”, como o sistema operacional de computadores. Depois, com o aprendizado, vamos instalando outros softwares e gravando novos arquivos na mente. (v.48, p.42, 2009)

Então, por causa dos neurônios-espelhos, a criança tem a capacidade de imitar, precisamente, os sons vocais emitidos pelos adultos à sua volta. Bizzocchi acrescenta que a criança que aprende a falar é capaz de reconhecer e distinguir nuances mínimas dos sons, a ponto de perceber quais variações são funcionais para a distinção do significado e quais não. Então: “as crianças em fase pré-linguística são foneticistas natas”. Um detalhe é que quando aprendemos a nossa primeira língua, seus sons ficam cristalizados em nossa mente, fazendo com que tenhamos dificuldades de reproduzir sons peculiares de outros idiomas. “Quando aprendemos nossa primeira língua, ou língua materna, estamos ao mesmo tempo aprendendo a nos relacionar com o mundo. Nossa língua é nossa realidade, é por meio dela que pensamos e conhecemos a vida ao nosso redor”.
Por sinal, Edgard Murano, em Os preconceitos da pronúncia, publica na Revista Língua Portuguesa um artigo, exclusivamente, sobre o caso do “inglês macarrônico” do técnico Joel Santana, que virou motivo de chacota. Esta atitude brasileira foi analisada pela professora Lígia Velozo Crispino: “Tripudiar sobre gente como Joel Santana, assim, pode até ser divertido, mas é mais um sinal de preconceito do que efetiva inteligência linguística de quem o critica”. Ela diz que o sotaque brasileiro cantado é devido à grande complexidade e variação de tons do português, dando à nossa variante um tom característico. Os linguistas ingleses nomeiam a interferência do idioma materno na pronúncia de uma língua que não é sua de foreign accent (sotaque estrangeiro).
Estas diversidades linguísticas que comprovam que nossos diferentes jeitos de falar têm a ver com o meio em que vivemos, onde nascemos etc. são citados nos Parâmetros curriculares nacionais:

A variação é constitutiva das línguas humanas, ocorrendo em todos os níveis. Ela sempre existiu e sempre existirá, independentemente de qualquer ação normativa. Assim, quando se fala em “Língua Portuguesa” está se falando de uma unidade que se constitui de muitas variedades [...] A imagem de uma língua única, mais próxima da modalidade escrita da linguagem, subjacente às prescrições normativas da gramática escolar, dos manuais e mesmo dos programas de difusão da mídia sobre “o que se deve e o que não se deve falar e escrever”, não se sustenta na análise empírica dos usos da língua. (p.29, 1998)

Temos que ter claro que a língua é viva, pois está sempre se transformando com o tempo e lugar, já que é parte da cultura das diversas sociedades. Para o Gestar: “Isso mostra o caráter dinâmico da língua, como revela também a constante evolução da sociedade e de sua cultura, refletida sempre na língua. Esta, por sua vez, em constante construção pelos seus usuários, acaba por transformar as relações humanas e, portanto, a cultura e a sociedade”. É por isso que a sociedade, cultura e língua estão sempre relacionadas, pois são construções históricas do sujeito.
Voltando à diversidade linguística, BAGNO (1999) comenta sobre a necessidade da escola e das instituições voltadas à educação e cultura em abandonarem o mito da “unidade” do português no Brasil e devem reconhecer a verdadeira diversidade linguística de nosso país para que planejem melhor suas políticas de ação junto à população marginalizada dos falantes das variedades não-padrão.

3 BRASIL: UM PAÍS RICO EM LINGUAJARES, E FORTE NO PRECONCEITO

Basta observar a riqueza cultural de nosso país, para se pensar em variedades linguísticas. O Brasil é repleto de biodiversidade, religiões, danças, comidas. Antes mesmo dos portugueses virem, já havia diversos povos indígenas, com suas diversas línguas. E mesmo após a vinda de nossos colonizadores, muitos outros povos aqui fincaram suas raízes e trouxeram também seus idiomas.
Ainda hoje, estima-se haver mais de 200 línguas vivas no território. E Ana Paula Seiffert, pesquisadora do Instituto de Investigação e Desenvolvimento em Política Linguística, afirma em Um Patrimônio Brasileiro, na revista Língua Portuguesa que este número pode ser muito maior: “Cerca de 170 são indígenas e mais de 30 línguas, de imigração”. Um exemplo citado foi a cidade catarinense São Bento do Sul, em que além do português e da libras, há outras cinco: polonês, ucraniano, italiano, bávaro e uma variedade do alemão. Se estas diferentes línguas ainda são faladas aqui, como fica o português falado por estes povos?
Outro fator importante que influi nos nossos linguajares é a questão social. Nosso país possui uma grande diferença nas distribuições de nossas riquezas. Assim acaba afetando o acesso à informação e até às escolas. Há a dificuldade de aquisição de livros e lazeres como teatros ou boas músicas. As pessoas usam um linguajar de acordo com o ambiente em que vivem, em que trabalham. E os alunos devem estar cientes disso tudo, para haver um respeito a quem tem um linguajar mais simples. O próprio linguista e escritor, Marcos Bagno, que luta contra a discriminação social por meio da linguagem, mostra no livro Língua de Eulália, que falar diferente não é falar errado; pois, o que pode parecer erro no português não-padrão muitas vezes tem uma explicação lógica, científica (linguística, histórica, sociológica, psicológica).
No livro Preconceito linguístico: o que é, como se faz, Bagno comenta:

A verdade é que no Brasil, embora a língua falada pela grande maioria da população seja o português, esse português apresenta um alto grau de diversidade e de variabilidade, não só por causa da grande extensão territorial do país – que gera as diferenças regionais, bastante conhecidas e também vítimas, algumas delas de muito preconceito -, mas principalmente por causa da trágica injustiça social que faz do Brasil o segundo país com a pior distribuição de renda em todo mundo. São essas graves diferenças de status social que explicam a existência, em nosso país, de um verdadeiro abismo linguístico entre os falantes das variedades não-padrão do português brasileiro – que são a maioria da nossa população – e os falantes da (suposta) variedade culta, em geral mal definida, que é a língua ensinada na escola. (p.16,1999)

É importante os alunos terem contato com o diferente. Mostra que o diferente pode ser interessante e não vir a ser ridicularizado.
Edmilson José de Sá, em A língua que aprendemos, a língua que falamos, publicado na revista Língua Portuguesa, diz que as variantes linguísticas são as duas ou mais formas que veiculam um mesmo sentido e compõem o conjunto de uma mesma variável linguística. “A variação pode ocorrer no léxico (como no exemplo entre aipim e macaxeira), na fonética (as pronúncias), na morfologia (como o apagamento do morfema indicando infinitivo) e na sintaxe (estrutura das frases).”
Inclusive, a ideia de se elaborar um atlas linguístico do Brasil foi em 1952, com a fundação da Comissão de Filologia da Casa de Rui Barbosa. De acordo com as linguistas Suzana Cardoso e Jacyra Mota, no site www.comciencia.br, a retomada do Projeto ALiB (Projeto Atlas Linguístico do Brasil), foi aprovada em Salvador, em 1996, no Seminário Caminhos e Perspectivas para a Geolinguística no Brasil. Ele foi realizado através do Instituto de Letras da UFBA, com a participação de pesquisadores da área de diferentes regiões brasileiras e com o assessoramento do Prof. Michel Contini, da Universidade de Grenoble (França).
Sá cita que, em 1826, o Atlas Ethnographique du Globe, do geógrafo Adrien Balbi, menciona a diversidade linguística:
A diversidade linguística existe porque as línguas porque as línguas são aprendidas e usadas porque o aprendizado de uma língua e seu uso são processos criativos que compreendem um sistema extremamente complexo. Quando uma criança aprende a falar, o sistema linguístico é basicamente idêntico ao usado em seu redor. É inevitável, contudo, que ocorram certas diferenças entre o sistema linguístico que a criança assimila e aqueles que lhe serviram de modelo; pode apenas observar as realizações linguísticas e, com base nessa evidência bastante indireta deve proceder (subconscientemente, é claro) à sistematização de um sistema linguístico que reproduza sua competência linguística. Levando em conta a grande quantidade de detalhes que existe numa língua, surgirão, evidentemente, pequenas discrepâncias. (vol. 20, p.29, 2009)

A língua que aprendemos, a língua que falamos faz uma viagem às diversas regiões do Brasil, mostrando a rica diversidade. Por exemplo, no Norte, o pesquisador Arlon Francisco Carvalho citou os diversos vocábulos ligados a terreno ou terra próxima ao rio: várzea, igarapé, varje, varja, valja, valje, vaji, vaja, garapé. Para o cigarro de palha: cigarrilho, porronca, tocha, tarrugo e tauari. No Nordeste, a professora Maria Socorro Aragão citou as diversas referências ao acessório soutien. Na Paraíba: corpete, califon, corpinho, porta-seio, guarda-seio e bustiê; na Bahia: corpete, califon, corpinho, porta-seio, guarda-seio, aperta-seio e sustenta-seio; e em Sergipe: corpete, califon, porta-seio e guarda-seio. No Centro-Oeste, o professor Dercir Pedro de Oliveira catalogou a palavra rugas como: pé-de-galinha, enrugado, prega, geada, pezinho-de-galinha, pé-de-piru e rusga. No Sudeste, exatamente no ABC paulista, Adriana Cristina pergunta aos moradores como é que chamam um pequeno rio de uns dois metros de altura, e teve as seguintes respostas: córrego, riacho, riozinho, bisca, brejo, canal, lagoinha, laguinho e valeta. Descendo ao Sul, Greize Alves da Silva e Vanderci de Andrade Aguilera pesquisaram como é chamada a ave preta que come animal morto e podre. Então, ouviram: urubu, corvo, abutre, come-carniça, bicho-carniça, corcovado e carniceiro. E para a palavra galpão, foram encontradas as variantes: paiol, garagem, rancho, barracão e tulha.
Para o Gestar, em relação à diversidade linguística, nenhum desses dialetos é melhor que o outro, pois cada um cumpre perfeitamente suas funções comunicativas, no âmbito em que é usado. Então, considerar um superior a outro é um preconceito sem fundamento. Também, num diálogo entre as personagens do A Língua de Eulália, de Bagno, há a fala: “Todas as variedades de uma língua têm recursos linguísticos suficientes para desempenhar sua função de veículo de comunicação, de expressão e de interação entre seres humanos. Mas por alguma razão, ou razões, só algumas servem de base para o padrão”. E explicou que uma das razões é a valorização do jeito de se falar dos lugares mais desenvolvidos. Por exemplo, a história no Brasil, aponta que foram Rio de Janeiro, São Paulo e Minas Gerais as mais influentes. Também, mesmo em São Paulo, há o preconceito em relação às cidades do interior: “a suposta superioridade do urbano sobre o rural”. Exemplificando: a chacota com o r de quem mora no interior.

4 O USO DAS VARIAÇÕES LINGUÍSTICAS NOS MEIOS DE COMUNICAÇÃO

Por falar-se em interior, basta assistirmos a algumas novelas televisivas para lembrarmos de algumas personagens que tinham esse sotaque. Muitas vezes, há, sim, uma inferiorização destas pessoas. Tanto que são sempre os mais ingênuos e ignorantes. Entretanto, é bom levar em conta que esses falares certamente enriquecem as obras, pois dão mais identidade às personagens. Alguns exemplos são: o Jeca Tatu, de Monteiro Lobato; Macunaíma de Mário de Andrade. Também, em tempos mais recentes, a Mirna (Fernanda Souza) que tinha a Pata Doralice, em Alma Gêmea; a Márcia (Drica Moraes) e Timóteo (Marcelo Novaes), da Chocolate com Pimenta; e o Julião Petruchio (Eduardo Moscovis), do Cravo e a Rosa. Todas de Walcyr Carrasco. E indo para as histórias em quadrinho, temos o famoso Chico Bento, de Maurício Souza, que parece nos levar para o interior brasileiro.
Muitas vezes, a emissora Rede Globo tem que buscar profissionais que trabalhem os sotaques nos artistas. Alguns dos exemplos foram o caipirês da novela Paraíso, conforme cita Keila Jimenez, em Sotaque de novela, da revista Língua Portuguesa (2009). De acordo com a instrutora de dramaturgia e prosódia, Íris Gomes, o sotaque não foi tão mato-grossense, pois lá há um falar misturado com influências do Sul, da fronteira, e dos índios. “Optamos por uma prosódia caipira”. E disse: “Seguimos o Amadeu Amaral, um estudioso de linguagem popular que diz que o que une o Brasil de Norte a Sul é a língua caipira. Essa acaba sendo a opção mais visitada em dramaturgia”. Então, os sotaques não são equivalentes aos reais das determinadas regiões. É só analisar o sotaque nordestino das novelas que não corresponde totalmente aos linguajares dos nove estados do Nordeste, já que cada lugar tem suas peculiaridades: “nuances de prosódia”.
Mas não é apenas o “caipirês” que é explorado nestas obras. Íris também trabalhou com o elenco da Caminho das Índias. Basta lembrar das expressões que saiam da boca do povo na época “Are baba”, “firanghi estrangeira”, “baldi”, “atchá”. Estes termos híndi, língua oficial indiana, foram adaptados à fala brasileira. Entretanto, algumas pronúncias e acentos foram mudados, já que, na Índia, há fonemas que não são usados aqui e que soariam mal aos ouvidos dos telespectadores brasileiros. Íris disse que foram três meses de pesquisa e oficinas de cultura indiana. “Nosso jeito de falar tem tudo a ver com a forma de viver, de onde viemos. O ator não tem de aprender uma língua ou sotaque, tem de apreender”.
Outras novelas que retratam bem o falar de uma determinada região são as inspiradas nos romances de Jorge Amado, como Tieta e Gabriela. Em O amante da expressão popular, matéria sobre o romancista baiano Jorge Amado publicada na Revista Língua Portuguesa, Alceu Luís Castilho fala sobre a valorização do autor pelas expressões populares, pela fala do povo da Bahia. Ele cita a fala da professora Ediolene Dias Mattos: “A proposta da narrativa poética de Jorge Amado era chegar ao povo da maneira mais simples e direta possível, com uma linguagem em que o povo pudesse ser identificado” (vol. 32, p.32, 2008).
Tadeu Luciano Siqueira chegou a fazer uma pesquisa nas obras de Jorge Amado e encontrou diversas palavras relativas a maridos traídos: marido conformado, boi manso, boi de carro, capão de terreiro (galo capado), homem “coberto de chifres”, ornamentar a cabeça e iluminar a testa. E citou também para prostitutas: “Há variações inúmeras. Só em Gabriela, há ‘putas’, ‘quengas’, ‘manceba’, ‘negrinha’, ‘prostitutas’, ‘sirigaitas’ (interesseiras), ‘caboclinhas’ (pobres), ‘filial’, ‘cabrochas’ (novas).” E comenta que em Tieta, era usado muito mais o termo “quenga”, do que em Gabriela; talvez, porque se passava na fronteira com Sergipe, onde a palavra era mais empregada.
Outro exemplo de linguajar explorado foi o “surfês”, da novela Três Irmãs. Já que se tratava do universo do surfe. Quem colaborou para haver mais originalidade na trama foi a colaboradora Adriana Chevalier, nascida em Ipanema. Ela teve namorados surfistas, filho surfista e diz que sempre fez parte desta “galera”. Um dos seus esforços foi evitar que o sotaque estigmatizasse os praticantes do surfe. “Minha preocupação foi buscar diálogos que humanizassem os surfistas, tirar esse preconceito de que todo surfista é burro. Você pode usar uma linguagem cheia de gírias, e, mesmo assim, ter muita cultura”.
De acordo com a fonoaudióloga Leila Mendes, que prepara atores e políticos, esses sotaques ouvidos na TV influenciam a nossa linguagem, pois pessoas que moram em cidades pequenas, muitas vezes, acabam imitando os sotaques de cariocas e paulistas que são ouvidos nas telas.
Jimenez citou também os trabalhos linguísticos realizados por Íris em minisséries globais como Hoje é Dia de Maria e Grande Sertão. Para a profissional, especialista em linguagem popular que se diz interessada pelas prosódias e várias maneiras de se falar no Brasil, “os sons consonantais importantes para diferenciar os sotaques no Brasil vêm do s e do r depois de uma vogal. A utilização dessas letras determina tudo”. Mas acrescenta que alguns fonemas devem ser neutralizados, como o chiado do s carioca, pois incomodam o telespectador pelo barulho provocado pelo microfone.
Já, em relação às produções de época, como não há muitas alternativas de áudios para saber como eram os falares em determinados tempos, a opção usada é a própria leitura. Segundo Leila Mendes, há apenas a ideia de como se falava no passado. “Sabemos que era mais erudito, que as pessoas pronunciavam os sons completos das palavras, mais ou menos, como se lê. Hoje, comemos letras ao falar, preposições desaparecem, é tudo abreviado na fala”.
Levando em consideração o linguajar relacionado à questão social, pode-se observar que ele é utilizado na mídia, muitas vezes, revelando um ser ignorante, chegando a ridicularizá-lo. Um exemplo é o Seu Creysson, interpretado pelo comediante global Cláudio Manoel do Casseta & Planeta. Ele apresenta características físicas exageradas, como as citadas no Wikipédia:
Topetinho para o lado (com o resto da cabeça careca), os óculos de armação grossa com esparadrapo, a falta de alguns dentes na boca, o bigode, a camisa vermelha, a barriga protuberante, e por fim, a sua característica mais conhecida, seu modo de falar todo "errádio" (repleto de solecismos absurdos) e com um sotaque característico que tornou o personagem famoso. (http://pt.wikipedia.org/wiki/Seu_Creysson)

O que mais chama a atenção no Seu Creysson é o linguajar que faz uma chacota a uma pessoa de classe baixa.
Outra grande ridicularização ao simples cidadão foi a música da banda Mamonas Assassinas, Chopis Centis (1995): que usaram o riff da Should I Stay ou Should I Go (1982), da banda inglesa The Clash.
Basta ouvir a primeira estrofe, “Eu 'di' um beijo nela/ E chamei pra passear/ A gente 'fomos' no shopping,/ Pra 'mó de' a gente lanchar”, para ver como há a depreciação do falar do cidadão simples e trabalhador. Um detalhe do terceiro verso é que o cantor Dinho canta “shopínguí”, mostrando a maneira errônea na tentativa de falar a palavra inglesa. E em relação ao refrão “Quanta gente/ Quanta alegria,/ A minha felicidade/ É um crediário/ Nas Casas Bahia”, a palavra “quanta” é falada “quantcha”. Também, há elementos ligados ao regionalismo como a palavra “mó de”, utilizada no interior do Brasil, como em Minas Gerais.
E por falar em Minas Gerais, a banda Pato Fu canta, propositalmente, a Vida Imbecil toda com sotaque do interior mineiro. Ao ouvir o refrão, cantado por John e Fernanda Takai, “Esse mundo é tão perfeitim/ Esse mundo é mesmo um amor/ Terra boa que Deus deu nóis/ E nóis quer mudar o mundo”, percebe-se o r arrastado. Inclusive, nesta música há uma expressão tipicamente usada pelos moradores do interior: “Né mêsm?”. Entretanto, não há um ar de deboche como citado anteriormente.
Aqui mesmo em Itajaí, há alguns exemplos do uso de nosso linguajar litorâneo catarinense, ou o peixeiro, como na Papa Siri, do itajaiense Carlos Coria, que brinca com o “Tásh tolo?”, “bobiça” e “ãh, ãh, ãh”. A Tarrafa Elétrica, que iniciou em 2003, com o jornalista Evandro Che Marquesi e o estudante de Jornalismo, Cassiano Bazana, também registra bem o nosso jeito de falar, cantando a cultura do povo de uma cidade praieira, que está sempre se desviando dos diversos containeres, causados pelo Porto de Itajaí, brincando com o boi-de-mamão, e comendo um peixe-frito, através do sotaque peixeiro. As letras usam expressões típicas do povo da região litorânea como “Amola a faca/ pra cortá a tainha”, do contexto pesqueiro e “alevanta, boi, alevanta/ alevanta, boi, pra brincar”, da brincadeira do boi: versos da Auto-dançante. A Cidade dos containeres mostra o nosso falar que “come” o s no fim dos plurais: “Vamos reciclar container/ pra fazer as percussão/ vamos reciclar container/ pra dar voz para o povão”. Assim como o refrão da Auto-dançante: “Auto-dançante, boi-de-mamão/ com as vaca toda segue a procissão”.

5 APLICANDO AS VARIAÇÕES LINGUÍSTICAS EM SALA DE AULA

Inicialmente, é importante falar sobre a própria história da Língua Portuguesa, com suas transformações, navegações marítimas e imigrações.
Para analisar sobre a mudança que há na língua com o decorrer do tempo, é interessante mostrar jornais antigos e até músicas. Alguns exemplos que podem ser usados em sala de aula: um trecho do jornal itajaiense “Itajhay”, de 1884, uma gravação do Repórter Esso e a música Fui ao Dentista, interpretada por Moreira da Silva (carioca nascido em 1912), que conta com diversas expressões, como: “chumbar uma panela”, “gajo” e “minha tripa ficou fria”. E a O que é que a baiana tem? (1939), de Carmen Miranda, que mesmo nascida em Portugual, veio ainda bebê ao Brasil e foi criada na Lapa carioca nas décadas de 1910 e 1920. Como consta em seu site: assimilou a estética, a linguagem e as novas sonoridades do lugar e da época, aprendeu as gírias e expressões das rodas boêmias, suas favoritas, e criou um personagem que seria uma representação do século 20.
Outra ideia é analisar nosso idioma na época do trovadorismo, como a Ondas do Mar de Vigo, cantiga de amigo de Martin Codax (séc. XIII), gravada pelo Anima. Ela mostra que nosso idioma era parecido até com o espanhol. Há também, na internet, diversos dicionários, como uma lista com gírias antigas. O blog pessoal da autora deste artigo conta com diversos dicionários. Estas atividades dizem respeito à diversidade linguística provocada pela história, pela transformação do idioma e, consequentemente, de suas falas.
Já em relação ao regionalismo, podem-se apresentar algumas músicas de artistas brasileiros de diversas regiões: como os cordéis de Causos e Personagens do Interior, de Abdias Campos (pernambucano, como ele narra as histórias, percebe-se bem o sotaque), Rio 40 graus, de Fernanda Abreu (carioca, nota-se s chiado); Asa Branca, de Luiz Gonzaga (pernambucano, na música aparecem até algumas interjeições, como “ôxi”); Herdeiro da Pampa Pobre, de Gaúcho da Fronteira (música gaúcha que carrega expressões ligadas ao gado e a terra, como: “Onde a ganância anda de rédeas soltas”, “caudilho”, “minha grei chirua”); Vida Imbecil, do Pato Fu (que cantam com sotaque e expressões mineiras); e para valorizar o linguajar da região litorânea de Santa Catarina, Papa Siri, de Carlos Corea (usa muitas palavras típicas da região como as da área da pesca: “puçá”, “batera”; e as típicas expressões “táx tolo?” e “bobiça”) e a Auto-dançante, da tarrafa Elétrica.
Ainda em relação ao regionalismo, mostrarei o “Dicionário Peixeiro”, que é uma maneira divertida de se identificar com o jeito itajaiense de se falar e os diversos dicionários, como o do interior de São Paulo, do gaúcho, mineiro, pernambuquês, as gírias atuais cariocas e um com palavras faladas em Portugal que têm um diferente significado no Brasil.
Outra apresentação será a de diversos vídeos com pessoas de vários lugares do Brasil falando : Amazonas, Bahia, Minas Gerais, Rio Grande do Sul, Paraná, Rio de Janeiro, São Paulo, Pernambuco, Sergipe, Piauí etc. As pessoas, falam seus nomes, de onde são, em quais lugares já morou, o que fazem e falam um pouco sobre suas cidades. A cada fala apresentada será colocado o ímã no mapa do Brasil , para que os alunos possam se localizar. E a cada fala, há a intervenção do educador. Pois não será analisado apenas o local onde a pessoa nasceu, mas os em que viveu, a profissão, escolaridade e até as características (indígenas, negros, alemães etc), já que todos estes fatores acabam, sim, influenciando no sotaque: todos os indígenas dos vídeos têm uma fala bem peculiar.
Os alunos poderão ter contato com o livro O Fantástico na Ilha de Santa Catarina, de Franklin Cascaes, mostrando a preservação da maneira como o povo fala na ilha de Florianópolis. Basta saber que o autor foi um dos grandes pesquisadores das histórias e falares da ilha catarinense. O cordéis também são excelentes materiais que carregam a fala popular.
Áudios gravados com pessoas da própria cidade também podem ser analisados. Tanto que dentro da mesma cidade há vários falares. Em relação a Itajaí e ao regionalismo, a Fundação Genésio Miranda Lins produziu o documentário Memória dos Bairros, em 2006. O objetivo era registrar a história oral, entrevistando diversos moradores, principalmente os mais antigos. Ficaram muito evidentes os sotaques dos descendentes italianos, alemães, japoneses e portugueses. Ou o documentário pode ser apresentado por inteiro ou podem ser gravadas algumas das falas.
Em relação à diversidade relacionada à condição social e profissão, ouvirão a música Chopis Centis, dos Mamonas Assassinas, que retrata o jeito de se falar de um cidadão simples. Além das palavras “engraçadas”, será analisada, principalmente, a chacota: fruto do preconceito a uma classe social que, muitas vezes, não teve escolaridade, por falta de oportunidades. Lembrar-se-á que o jeito de uma pessoa falar depende também do meio em que ela está inserida, se ela estudou ou não, das amizades, colegas de trabalho. É bom deixar claro, que estes linguajares também devem ser respeitados.
Serão ouvidos alguns áudios, como o de um usuário de drogas e o de um morador da Vila da Paz (bairro Nossa Sra. das Graças). Ambos foram gravados do filme-documentário O Peso do Nome – Um bairro. Dois Nomes, da jornalista Ana Paula Blasi (2007). Seria interessante até passá-lo à turma, para uma melhor observação. Ambos falares retratam pessoas que não tiveram condições de estudar. Inclusive, às vezes, acaba sendo difícil a compreensão do que se é dito. O primeiro também usa muitas gírias ligadas à criminalidade.
É bom saberem que algumas profissões exigem um linguajar até com entonações diferentes, como a dos jornalistas. Basta ouvir o jeito que um jornalista apresenta uma matéria, ou o que um radialista narra um jogo de futebol. O professor pode pedir para assistirem aos programas, para que haja uma discussão em sala de aula.
A música Cuitelinho, interpretada por Nara Leão, pode ser apresentada com sua letra. O professor pode pedir para os alunos destacarem as palavras cantadas “erradas”. Então, citarão: zóio, atrapaia, espaia, etc. Após, o professor explicará que são palavras faladas, principalmente, no interior do país, e por pessoas que, dificilmente, tiveram acesso a uma boa formação escolar. Entretanto, o professor dirá que estas palavras eram usadas no português arcaico, como Bagno comenta no A Língua de Eulália.
Ainda em relação às condições sociais, os alunos poderão ler o livro do Seu Creysson Vida i óbria, que retrata o jeito de muitos cidadãos simples falarem. E, mais uma vez, o professor deve lembrar os alunos sobre o respeito ao diferente.
Lembrando que a questão social tem a ver também com os grupos em que as pessoas convivem, identificando-se, um bom exemplo de dicionário a ser apresentado pode ser o dos surfistas.
Após essas várias explanações, com muitos debates entre educador e alunos na sala de aula, há algumas sugestões de atividades que os alunos podem realizar.
Uma delas é escreverem uma carta, como se estivessem apaixonados por alguém. E, também como seria se fosse através de email ou em depoimento no orkut. Após as leituras das cartas e e-mails, o educador pode selecionar alguns trechos, perguntando se quem escreveu foi um menino ou menina. Esta oportunidade será para levantar algumas questões ligadas aos linguajares do gênero masculino ou feminino.
Outra ideia de carta é pedindo para o prefeito fazer melhorias no seu bairro. Detalhe: eles devem se posicionar como se um cidadão, ou cidadã, simples.
Após todos terem escrito suas cartas, elas deverão ser distribuídas entre os colegas. Então, quem receber a carta deverá ser o prefeito e responder a que pegou. O professor dirá que este prefeito deverá ter tido acesso à norma culta.
As cartas deverão ser lidas a todos. Primeiro sempre a do cidadão simples, seguido da leitura da do prefeito. Ao terminarem todas as leituras, os alunos poderão falar quais foram as que mais chamaram suas atenções e por quê.
Outra atividade interessante é o uso dos linguajares, na produção de teatros ou radionovelas, havendo diálogo entre alguém de Itajaí e de outra pessoa de qualquer lugar do Brasil. Para isso, mesmo que tenham tido acesso aos vários vídeos e músicas, é interessante que eles façam suas próprias pesquisas dentro da comunidade ou família. Buscando não apenas termos que são ditos em outras regiões, mas com certa entonação diferenciada. É interessante levar mais uma vez os diversos dicionários, para que eles possam relembrar alguns termos a serem inseridos nos diálogos.
Se o educador optar pelo teatro, ele deve falar sobre a importância da postura (como se posicionaria a sua personagem, não dar as costas ao público, apenas se for propositalmente); sobre a dicção (seria importante até fazer alguns exercícios) ; expressão facial (se está assustado, alegre, triste, preocupado etc., o olhar deve demonstrar), se haverá mais objetos, onde colocar no cenário, noção do espaço; etc.
Se o diálogo for produzido para uma radionovela, seria interessante apresentar alguma ao grupo, antes mesmo de eles iniciarem o processo de criação. Falar que antigamente, elas eram apresentadas como as atuais novelas, todos os dias, e que as pessoas sentavam-se ao redor do rádio, para ouvi-las, assim como muitas famílias fazem atualmente, em frente às telas. Entretanto, a produção será de apenas uma história, com início, meio e fim. Para isso, o professor deve dar um limite de tempo, tanto mínimo, quanto máximo. Dizer que o grupo deve observar se deve levar algum objeto para fazer barulho e se tem ideia da inclusão de algum tema, para momentos de suspense, alegria ou outros. Deve-se lembrar que o principal recurso será a voz da pessoa. Ela é que deverá expressar todos os sentimentos.
Após cada apresentação dos teatros ou das radionovelas, a turma pode tentar adivinhar de onde são as personagens. E, quando todas forem apresentadas, pode haver um debate para ver o que ficou bom, o que mais chamou atenção do grupo e o que pode vir a ser melhorado para uma próxima oportunidade.
Outra sugestão de atividade que também pode ser apresentada através de um teatro ou radionovela é a exploração dos linguajares que são consequências da condição social de cada pessoa: o educador pode escrever em tarjas algumas profissões, como professor, advogado, jornalista, médico, pedreiro etc. Alguns grupos sociais: surfista, roqueiro, viciado em drogas, patricinha, playboy etc. Ou idoso, jovem e criança. E também apresentador e narrador, que deverá haver em todos os grupos.
Após, dividirá a turma em grupos de cinco ou seis e cada aluno pegará uma tarja. Um dos pontos mais importantes será criarem uma situação em que haja uma conversa com todas essas figuras sociais. O decorrer da atividade será parecido com a dos sotaques.
E outro exercício é improvisar uma história. O professor organizará a turma num círculo, ou sentados nas cadeiras ou no chão. Ele deverá explicar a atividade, em que terão que prestar muita atenção no que for contado pelo grupo e nas fichas mostradas pelo monitor.
O educador inicia uma história, que pode ser um conto de fada conhecido, como Chapeuzinho Vermelho. Quando ele bater as palmas, quem estiver ao seu lado é que continuará a história. Entretanto, o aluno deverá ler o que está escrito na ficha mostrada pelo professor, que cita diversas figuras sociais: idoso, surfista, patricinha, jovem com gírias, professor, político, trabalhador simples, caipira, padre, idosa etc. Então, deverá incorporar aquela pessoa e contar a história com o linguajar típico.
Outra opção é que, em vez de estar escrito nas tarjas as condições sociais, podem ser trabalhados os linguajares ligados à região de onde a pessoa vive, com expressões itajaienses, gaúchas, paulistanas, nordestinas entre outras. Então, a história deve ser contada, mas com estes termos incluídos, como “Táx tolo?”, “Bah, guri”, “Uai”, “Oxente”, ”Eita”, “Num carece”, “Cadiquê” etc. Outra sugestão é haver também gírias que foram estudadas como as antigas ou de determinados grupos: “cabrero”, “chuchu beleza!”, “bulhufas”.
Um detalhe importante, é que a história deverá ter um início, meio e fim. Antes do professor iniciar esses termos, pode haver uma revisão de seus significados.
É importante que sempre após cada atividade, haja uma avaliação da turma. E também a fala do professor sobre o respeito aos diversos linguajares, ao que se é diferente de nós. Lembrar que todos esses falares fazem parte da nossa cultura brasileira que é tão cheia de diversidades linguísticas.

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Já disse Bagno em Português ou Brasileiro?
Ensinar português é, então, firmar, afirmar, confirmar todo o folclore, toda a superstição que gira em torno dos fatos linguísticos na nossa cultura: “português é muito difícil”, “brasileiro não sabe português”, falamos uma língua “emprestada” que não respeitamos e que, ao contrário, “abastardamos” o tempo todo. É a perpetuação injusta e injustificável de um conjunto de mitos sem fundamento. [...] Estudar o brasileiro é dar voz à língua falada e escrita aqui, neste país chamado Brasil, 92 vezes maior que Portugal, habitado por uma população quase 17 vezes mais numerosa. É perceber que todas as línguas mudam, que toda língua é um grande corpo em movimento, em formação e transformação, nunca definitivamente pronto. (p.9-10, 2001)

Acredito que o professor de Língua Portuguesa deva, sim, apresentar as regras das normas cultas aos seus alunos, já que vivem num mundo em que o preconceito linguístico está longe de ser exterminado, e que seus falares serão cartão de visita para abrirem as portas a empregos dignos, não apenas mãos-de-obra baratas.
Entretanto, um professor de Língua Portuguesa deve também abrir esse leque de falares que temperam nossa língua portuguesa brasileira. Deve apresentar não apenas a ciência dos gramáticos, mas a dos linguistas, que tem como objeto de estudo o falar dos diversos brasileiros.
O professor pode fazer seus alunos mergulharem no porquê das variações, através da história, ou embarcando para qualquer região brasileira, entrando num tribunal repleto de termos jurídicos, ou soltando pipa com o menino de barriga vazia. Pode navegar pela internet, através de um diálogo apaixonado, entre um viúvo aposentado e uma diarista que acabou de ganhar o computador do filho que conquistou seu primeiro salário em São Paulo e que resolveu presenteá-la por não poder tê-la visitado no Natal.
Temos em nossas aulas uma chance de fazer nossos alunos acharem lindo quando chega um colega do interior do Paraná, puxando o r ou prolongando o e do “leite queeente”. De sentirem tristeza, não graça, quando escutam um programa de humor fazer uma sátira justamente daquele cidadão carente não só de informação, mas, principalmente, de respeito e dignidade. De serem curiosos em relação aos diversos jeitos dos brasileiros se comunicarem. De observarem os mais idosos falando, sem julgarem-nos antiquados.
Estudar com nossos alunos tudo isso é oferecer uma oportunidade de análise de sua própria identidade e de perceber no outro um ser que carrega uma história de vida.

REFERÊNCIAS


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BAGNO, Marcos. Português ou Brasileiro? São Paulo: Parábola Editorial, 2001.
BAGNO, Marcos. Preconceito linguístico: o que é, como se faz. São Paulo: Edições Loyola, 1999.
BAZI, Ana Paula. O Peso do Nome - Um bairro. Dois Nomes. Trabalho de conclusão do curso de Jornalismo. Itajaí. Univali, 2007.
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Teoria e Prática 1 – TP1: linguagem e cultura. Brasília, 2008.
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JIMENEZ, Keila. Sotaque de novela. Revista Língua Portuguesa, São Paulo, n. 44, p.36-41, jun. 2009.
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