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domingo, 29 de novembro de 2009

Matador em Poesia

seu Porto apresenta seu bairro


publicado no Platéia: outubro de 2007

No livro “Poesias Crônicas Contos”, produzido com textos que participaram do concurso literário para idosos, uma poesia chamou muito minha atenção, entre tantos textos que relatam as histórias de vidas dessas pessoas itajaienses, ou que escolheram a cidade para viver. Era uma poesia grande no tamanho. E, maior ainda no seu valor. Ela conta a história, através de seus versos musicados, do bairro Nossa Senhora das Graças: o popular Matador.
O poeta, trovador e improvisador Romeu da Silva Porto, de 84 anos, deve ser um grande observador. Ele conta, através da “O Velho Matador”, que neste bairro tão conhecido pela criminalidade, uso de craque, e por ser o local onde está cravado o cadeião, também mora a felicidade. O Seu Porto conta do surgimento do bairro: “onde um dia o progresso/ aqui chegou, e cresceu/ tempos velhos que se foi/ simples matador de boi,/ na lembrança então ficou,/ de uma rua enlamaçada,/ feita em forma de picada/ uma vila se formou”. Ele diz que antes não havia a cadeia, era uma vila bonita. Inclusive, para ele, o que deveria mudar no bairro é justamente esse presídio: “Esse presídio que envergonha nós tudo”.
A poesia fala, também, de tristezas, como a morte do boiadeiro João, que trabalhava no matadouro de boi: “Homem forte e destemido,/ tinha firmeza na mão,/ na primeira punhalada,/ acertava o coração”. Motivo de sua morte matada? Não concordou com o seu patrão em trabalhar aos domingos. Antes, era tudo pasto e os bois eram todos bravos: “O interessante é que nós tirava os couro de boi e o João empilhava o couro e ia pra Brusque, no bairro da Santa Terezinha. Faziam sapato”.
Para este homem, o orgulho do bairro é o Beco da Nice. “A Nice foi uma grande batalhadora, que fez no beco um córrego, sem nada e seco, fez o que tá agora”, recorda.
Seu Romeu não fala, ele declama. Há uns 60 anos que ele faz poesia. Onde nasceu? “no outro lado do mundo”, como ele mesmo diz. Na Polônia. Sua mãe morou num campo de guerra e ele tinha 25 anos de idade, quando ela morreu, com uma metralhadora na mão. “Com a guerra, o Stalin pegou 250 crianças e mandou pra América do Sul. 150 vieram pro Brasil e 100, pra Argentina”. Foi um senhor do Recife, Antonio da Silva Porto, que o criou.
Seu Romeu não conta só histórias do bairro, como demonstrou em sua poesia, mas de mundo. Ele conta que o homem que o criou colocou-o na Marinha. Ele disse já ter ido à guerra: “O Getúlio fez uma coisa errada. Deixou a Marinha pros Estados Unidos. Eu perdi minha vista na Coréia. O americano que é covarde, sem vergonha e tem medo de todo mundo, deixou nós lá na frente. Nós não tinha nada com aquilo”, relembra. E mostra a bala que tem em seu pescoço e aponta para o olho que perdeu. Mas a vista perdida não tirou sua visão de mundo.
Enquanto anda pelas ruas do bairro, diz que se sente muito bem: “Todo mundo me conhece. Eu fui um dos primeiros daqui”. E ele caminha e caminha pelo bairro que, como diz sua poesia, é do Seu Minela que fez o campinho, do Negro Rita que fundou o baile onde negro não podia entrar vestido de branco, do Maneca da Catarina da primeira rebelião do presídio, do CRAS que veio com a Associação de Moradores, do Matador em que se passava a Estrada de Ferro, onde tinha a capelinha de madeira. Enfim: o Matado do “povo forte e valente/ de pureza e sangue quente”.Em outro momento, ele faz mais uma rima:
“Quem tá passando aí?/ É o velho Porto/ o poeta de Itajaí”.

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Rubia